AR Olhe para cima, Francisco…
FRANCISCO Não sabia quem me falava… Mas fiz o que aquela voz me ordenava: olhei para cima. Embora fosse a pleno dia não pude ver o irmão Sol. O céu não era azul, estava sombrio, como se uma espessa camada de névoa cinzenta o envolvesse… Então a voz me falou de novo…
AR Saia daí, Francisco, saia… saia!
FRANCISCO Obedeci a voz, desci do edifício, sai da cidade. Aquela era uma voz poderosa e, não sei como o fez, mas um vendaval me trouxe até outro lugar da Venezuela, a estes campos verdes e reluzentes, onde agora estou, de onde vos falo… Ah… aqui sim está bom… Aqui o céu é azul e o irmão Sol ilumina radiante o campo…
AR Você tinha dificuldade de respirar na cidade, não é?
FRANCISCO Sim. E meus olhos ardiam. Mas já passou, obrigado por me tirar desse labirinto de ruídos e sobressaltos. E agora, diga-me quem é você…
AR Não pode me ver, mas estou em todas as partes. Não pode me prender, porque sou livre.
FRANCISCO Você fala como se fosse Deus.
AR Você disse bem, me pareço com ele.
FRANCISCO Quem é você?
AR Naquele seu canto você já me cantou. E ainda não adivinhou quem sou? Respira, respira fundo, talvez te lembre: em mim vives, em mim te moves, em mim sois.
FRANCISCO Irmão Ar!... É você? Você também quer falar comigo?
AR Não quero falar, quero gritar! E é urgente o que vou dizer!
FRANCISCO Por que está tão nervoso, irmão Ar? Estou te ouvindo.
AR Estão me envenenando, Francisco. Caracas, a cidade onde você esteve, é uma das mais poluídas do mundo. Lá foram me misturando com dióxido de sulfeto, monóxido de carbono, chumbo, óxido de nitrogênio…
FRANCISCO Não conheço nenhum desses venenos….
AR Não os conhece, mas os respira. Entram em teu corpo. Em teus pulmões. Francisco, a lista das cidades que estão cobertas com esses venenos se torna mais longa a cada dia…
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FRANCISCO Quando jovem, viajei uma vez ao Egito, e lá os céus eram claros e limpos...
AR Isso foi há séculos, Francisco. Vá agora e não poderá respirar. E o mesmo ou pior ocorre nas cidades da China e da Índia e em vários lugares da Terra. E envenenado, eu enveneno. Quando estou limpo não me veem, me respiram e dou vida.
FRANCISCO E quando você está sujo...
AR Não há outra alternativa que continuar me respirando. Mas assim já não dou vida. Eu vou os adoecendo da cabeça aos pés: a pele, os olhos, os pulmões, o coração, mulheres que abortam, crianças que não crescem, tumores, infecções...
FRANCISCO Mas, quem te suja para provocar tantas desgraças, irmão Ar?
AR Os motores queimando petróleo e petróleo e mais petróleo... E os venenos com que pulverizam as plantações... E a queima do lixo... E as florestas ardendo... E a fumaça dos aviões... Tudo isso me suja...
FRANCISCO E não há sabão neste mundo que possa limpá-lo?
AR Sim. Sabe quem pode me limpar?
FRANCISCO Diga-me, irmão Ar.
ÁRVORE Eu respondo, Francisco. Nós, as árvores.
FRANCISCO Você também fala? Qual o seu nome?
ÁRVORE Me chamam Ipê. E vivo aqui, nestes campos.
FRANCISCO Você é lindo com tantas flores amarelas...
ÁRVORE Obrigado pelo elogio, Francisco. Pois te digo que nós, as árvores, somos os pulmões da Mãe Terra. Durante o dia respiramos esses venenos e os convertemos em ar limpo.
FRANCISCO Verdade? Muitas são as maravilhas que Deus fez.
ÁRVORE Mas essas maravilhas os humanos também as destroem. As madeireiras, os criadores de gado que queimam a floresta para pastos, as estradas que cortam a selva, estão nos destruindo... Ouça essa motoserra... Uma árvore a menos no mundo... Sabe quantas florestas desaparecerão nesse ano?
FRANCISCO Não faço ideia...
ÁRVORE A cada 10 segundos a Mãe Terra perde mil árvores. Mil de nós! Quando eu e você acabarmos de falar, Francisco, terão caído 60 mil árvores, uma floresta inteira.
FRANCISCO Mas, por que destroem assim a natureza que Deus nos presenteou?
AR Por dinheiro, Francisco. Arrasam as florestas para vender madeira, para semear o que lhes dá dinheiro, para fazer mais indústrias que lhes darão mais dinheiro. Enlouquecem por dinheiro.
FRANCISCO Igualzinho a Pedro Bernardone, meu pai… em vez de olhos tinha moedas na cara. Só lhe interessava o dinheiro!
AR Deus criou a mim, o Ar, para dar vida, para que todas suas criaturas possam respirar.
ÁRVORE E criou a nós, as árvores, para dar frutos e dar sombra. Para atrair a chuva e limpar o ar. Mas os humanos já destruíram a metade de todas as árvores do planeta. Se continuarem assim, se não mudarem, em umas poucas gerações já não sobrará em pé uma só de nós para contar o desastre.
Diz o Papa Francisco em sua encíclica Laudato Si, Louvado Sejas:
Existem formas de poluição que afectam diariamente as pessoas. A exposição aos poluentes atmosféricos produz uma vasta gama de efeitos sobre a saúde, particularmente dos mais pobres, e provocam milhões de mortes prematuras... Entre os pobres mais abandonados e maltratados, conta-se a nossa terra oprimida e devastada, que “geme e sofre as dores do parto” (Rm 8, 22). Esquecemo-nos de que nós mesmos somos terra (Gn 2, 7). O nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta; o seu ar permite-nos respirar, e a sua água vivifica-nos e restaura-nos. (Laudato Si 20, 2)
E disse o Papa Francisco no Encontro com os Movimentos Populares na Bolívia:
Dessas sementes de esperança semeadas pacientemente nas periferias esquecidas do planeta, desses brotos de ternura que lutam por subsistir na escuridão da exclusão, crescerão árvores grandes, surgirão florestas cheias de esperança para oxigenar este mundo.
PERGUNTAS PARA O DEBATE
1- Que nível de poluição existe na sua cidade? Pesquise.
2- Você tem carro? Você partilha o seu carro com teus vizinhos e vizinhas? O transporte público funciona bem?
3- Estão desmatando as florestas no seu país? Por quê?